Cultivada entre idas e vindas no Complexo da Maré, a banda Canto Cego floresce no cenário carioca e traz em suas raízes uma delicada veia poética, assim como um robusto rock visceral.


Criada em 2010 por Magrão, Diogo (ex-guitarrista) e Hugo (ex-baterista), a Canto Cego começou sua história como “Veneto”. Apenas com a entrada da vocalista Roberta Dittz é que o grupo se reinventaria, trazendo para suas apresentações toda a força das performances poéticas – influenciando até mesmo o seu repertório. Ainda em outubro de 2010, a banda começou seu primeiro processo de criação, com o foco sobre a poesia e o rock somados às influências do espaço urbanizado ao qual frequentavam.

Com algumas mudanças na formação (incluindo Jorge e Henrique, ex-bateristas que empunharam com maestria as baquetas da banda), a Canto Cego se reestrutura com Rodrigo Medeiros nas guitarras e Ruth Rosa na bateria – e dá início definitivo à sua caminhada pela cena carioca. Nos últimos 4 anos, a banda fez shows no Corujão da Poesia (Ipanema), Cinerock (Nova Iguaçu), Picadeiro da Palavra (Centro), SESC Madureira, CCCG, Circo Voador (como finalista do WebFestValda). Além disso, conquistaram o segundo lugar no Festival Intercultural na lapa, e primeiro lugar no Festival da Nova Música Brasileira – premiação que rendeu a oportunidade de gravar duas faixas produzidas por Felipe Rodarte no estúdio Toca do Bando, assim como de abrir o show da banda Detonautas no palco do reinaugurado Imperator.


Proposta

Tendo como base uma relação íntima entre o rock e a poesia, a Canto Cego foge aos padrões e leva a cada palco uma apresentação única e vibrante. Afinando a veia poética, inclui em alguns shows a leitura de poesias intercalada com músicas. Enquanto algumas canções são completamente faladas, outras alternam entre a fala e o canto. Em determinadas apresentações, convida poetas e pessoas do público para a realização de intervenções no palco, criando uma mistura de composições, ambientações e improvisações. Dando ao espetáculo o ar de grandeza merecido, a banda traz à tona o formato de performance-show, onde as canções tomam forma através de atores que, ocupando o espaço do público, realizam ações referentes às composições de cada música.

Cena Carioca


Juntos das bandas Novezeronove, Folks, Drenna e Stereophant, fundaram o evento Rock Bandido junto com a hashtag #acenavivee atiçaram as redes sociais com a campanha de volta da Radio Cidade. Um espírito de grupo e de motivação de cena que vem se multiplicando e agregando novas bandas que vem surgindo de re-surgindo na cena do independente carioca. Este ano a banda volta a Toca do Bandido pra conclusão de um faixa com patrocínio da Converser Rubber Tracks, e prepara em sequência o lançamento de 3 clipes, junto com o primeiro EP.

A Banda

Roberta Dittz


Atriz e poeta, busca nas sonoridades uma forma mais intensa de comunicar os sentimentos. Estudou teatro desde os anos de escola, tendo como maior base as ações físicas e vocais. Ouve entre muitos Lenine, Concha Buika e Pantera. Se apresenta frequentemente em eventos de poesia com poetas como Tavinho Paes, o compositor Jorge Benjor e o grupo Organismo. 

Rodrigo Medeiros


Produtor Cultural e Musical, Rodrigo participa de projetos musicais desde a infância quando aprendeu a tocar na guitarra do pai. Hoje, produz eventos como Samba Rock no SESC, e grava em seu home-estúdio diversas bandas de sua região. Rodrigo é atento as novidades musicais, admira a música nacional, e valoriza timbres suaves. Encontra nas cordas da guitarra o peso, mas sem perder a leveza.

Magrão


Graffiteiro e artista plástico, Magrão tocava nas bandas do colégio e dividia sua rotina dando aulas de graffiti. Procura entre os graves e arranjos de baixo algum groove e swing que, pincelados ao som simples da banda, transformam o som. É cheio de novidades melódicas quando o assunto é criação. Magrão recentemente participa de exposições artísticas e coletivos que unem a vida urbana à arte.

Ruth Rosa


Ruth aprendeu a tocar bateria nas aulas de música da igreja em que o pai ministrava. Estudou bateria e flauta transversa dos sete aos quinze anos, quando decidiu não seguir mais os desejos do pai. Desde então participou de eventos diversos nas redondezas da Maré até se fixar como baterista convidada da banda Café Frio. A integrante mais recente da Canto Cego, vindo reforçar o espírito performático da banda.

Entrevista

Vocês seguem uma “estética” muito bem definida. Explica pra gente o que é “Rock+Poesia”?
O Rock e a Poesia foi o nosso encontro, eu levava alguns poemas escritos pros ensaios e no meio dos improvisos começavam a surgir melodias. Disso surgiram as primeiras músicas coletivas da banda e percebemos que essa mistura podia dar certo. Além das próprias poesias musicadas fazíamos instrumentais com poesia falada, e isso nos rendeu alguns "números", e abriu o leque de possibilidades da banda no palco. Dentro desse universo das palavras como ponto de partida estabelecemos essa identificação. Quando as pessoas perguntam o que é Canto cego, a gente responde Rock e Poesia. Poesia porque expressar nosso cuidado com as palavras e sentidos, e Rock pelo peso, força e atitude que expressamos no palco.

Qual a importância dessa “construção” lúdica, envolvendo performances e intervenções durante as apresentações?
Sempre foi um desafio, possibilitar trocas em palco, chamar convidados, participar de eventos de poesia com poetas entrando e saindo do show, participar de eventos que envolviam outras artes, fora a música. No início a gente não ligava muito pros detalhes da performance, mas sempre foi um desejo nosso fazer as apresentações se tornarem cada vez mais vivas. E logo que começamos a investir em cuidados com figurino, maquiagem, os olhares pra gente já mudaram. Parece bobo, ou fútil atrelar essas superficialidades ao que é relevante pra banda, mas fez diferença e só fez destacar todo o carinho que a gente dedica as metáforas de cada música, a história que a gente começa a contar desde o momento que pisamos no palco. Só que é um processo que está em construção e que se transforma em cada experiência, em cada pessoa que surge no nosso caminho. 



A banda tem uma presença de palco muito marcante. Isso é algo da personalidade do grupo, que surge naturalmente, ou faz parte das intervenções?
A gente sempre se cobrou muito pela performance, eu tenho mais facilidade por causa do teatro mas a banda toda comprou essa vontade de fazer diferença no palco. E sem isso, eu acredito que não faria sentido a Canto Cego, não faria sentido um show sem tentar fazer o público perceber o que você tá querendo dizer. Ao longo dos anos de banda a gente vem ganhando segurança pra arriscar, pra aprender com o próprio público, com as próprias situações, é um aprendizado que não tem muito com treinar sem ser ali na hora da apresentação. Mas é importante relembrar que é resultado de muita cobrança interna, a partir dessa cobrança que cada um foi encontrando sua identidade e verdade dentro da performance.

De que forma a banda se relaciona com o processo de criação? Como surgem as composições?
Atualmente está bem caótico, tem músicas que eu fiz no violão, tem músicas que o Rodrigo fez o instrumental e coloquei uma voz, tem músicas que do improviso fomos tirando o refrão e as estrofes até achar a estrutura completa. Tem algumas que faço com o Magrão com ele no violão e aí depois a banda junta vai reconstruindo. Nossa pesquisa ultimamente é testar vários tipos de processo pra evitar que uma música fique parecida com a outra (o que é inevitável), mas acreditamos que isso tá dando um caldo legal e evidencia nossas personalidades. As letras, até hoje, foram só minhas um pouco pelo meu hábito de escrever e de ficar horas quebrando cabeça com a métrica e os sentidos, mas também estamos sondando parceiros de outras bandas e poetas amigos pra composições novas.

Foto: Paulo Barros


A poesia é um fator marcante no trabalho de vocês. O que a poesia em si – e seu processo de criação – representa para o grupo?
Foi na poesia que me entendi como "comunicadora" (não sei outra palavra melhor), desde que comecei a frequentar eventos de poesia despertou em mim essa necessidade de escrever e dizer palavras escritas, e essa descoberta aconteceu junto com o surgimento da banda em 2010. Não podia deixar de propor isso pro grupo, e a banda entrou de cabeça na ideia. O mais bonito foi ver que o que era uma necessidade minha virou uma vontade do conjunto e isso foi fundamental pra que a gente pudesse construir a nossa identidade e explorar novos caminhos. 

O som de vocês traz um mix de sensibilidade emocional e rock visceral. Qual é a sensação de transmitir isso tudo para o público de vocês?
É maravilhoso, na verdade, acredito que não nos vemos mais sem essas doses semanais de banda e público. Desde a troca de olhares do palco, como o contato depois dos shows, os amigos que ficam e surgem em cada lugar que tocamos. Ver que as pessoas se afetaram de alguma maneira é o que transforma a Canto Cego a cada dia, e que nos faz mais forte na arte de se doar ao outro. A gente sempre discute o sentido da banda existir, e todas nossas perguntas são respondidas quando tocamos e trocamos com o público.



Vocês tem um certo papel de incentivadores, tendo inclusive organizado um evento em parceira com outras bandas. Como vocês analisam a nova cena da música independente carioca (e nacional)?
Desde o ano passado que tivemos esse desejo de se unir com amigos da Novezeronove, Folks, Drenna, Ollie, Clashing Clouds, Imóvel, Innabitual, Stereophant. E desde então tudo mudou. Muito pra gente e para o conjunto, virou uma grande rede, quando um se beneficia todos ganham juntos. Não só essas bandas amigas mas ecoa pro cenário inteiro. E a gente vê várias bandas se unindo e se organizando em outros núcleos que conversam entre si. Nem consigo citar aqui todo mundo que faz parte disso, na verdade nem existe um núcleo porque é generalizado. Uma das nossas conquistas como cenário foi volta da Rádio Cidade e todo o esforço que tivemos de agitar as redes com esse pedido. A Cidade voltou, a Kiss voltou, vários canais de rock a gente observa que estão sendo criados e todo mundo ganhou com isso. A gente vê bandas antigas voltando, bandas mainstream compondo novas músicas, e principalmente bandas novas surgindo. É o rock se preparando pra daqui a pouco estar na crista da onda. Nos orgulha estar participando desse processo na cidade do Rio, e acreditamos que esse movimento, com certeza, já se espalha pelo estado e pelo Brasil.

Qual a importância da ação das bandas na construção dessa nova cena?
Depois desses anos de movimentação não temos dúvida de que as coisas só vão pra frente se as bandas se unirem cada vez mais. É difícil pra alguns perder a vaidade, porque infelizmente é do mundo ocidental esse olhar competitivo para o outro. Mas cada vez mais a gente tem provas de que tem lugar pra todo mundo, que somos realmente um coletivo. Sem dúvidas a Canto Cego não estaria tão viva se não fosse a união das bandas e todas as pessoas (nem sempre de banda) que geram novas ideias e fazem acontecer de alguma forma. Não só a Canto Cego, sei que muitas bandas tem a mesma sensação de que não seríamos visíveis sem essa soma de desejos, como diz uma música do Medulla "pra que a gente possa dividir nosso sonho de multiplicar". Cada banda que vemos fazer parte dessa entrega faz de si mais intensa, assim como fortalece o cenário por inteiro.

Para finalizar, a mesma perguntinha de sempre: quais os planos para o futuro?
Os planos são muitos, ainda bem! Queremos muito lançar um CD, mas como a grana é pouca estamos juntando e estudando as possibilidade de gravar um EP pro segundo semestre. Antes do EP, e depois desse lançamento de Nuvem Negra ainda temos mais um single pra lançar que é Maestrina, ela foi gravada pelo Pedro Garcia (baterista do Planet Hemp) há quase 1 ano e está esperando um clipe, mas ainda estamos decidindo se vamos disponibilizar ela antes do clipe. Estamos num processo intenso de composição de novas músicas, e também articulando shows pra que possamos expandir nossas fronteiras pra além do estado do Rio, e pra eventos de porte maior. Nada muito simples de se fazer, mas o que seríamos sem os desafios!?

Contato
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